sábado, junho 10, 2006

O Deserto dos Tártaros


Entre o irracional e o absurdo navega um livro hoje considerado como dos grandes romances italianos do séc. XX. Pertence a Dino Buzatti. E de que trata? Do destacamento de um jovem oficial não sabemos de que país para uma fortaleza mítica que faz fronteira com um misterioso deserto, o qual faz fronteira com um misterioso povo, mencionado como "os tártaros", embora esta denominação seja possivelmente mais poética do que real, ou geográfica.
O texto deslumbra a dar vida às correntes de alma do nosso jovem oficial, mas também ao glorificar os mais ínfimos acontecimentos, sem falhas. E de pequenas escaramuças, promoções e desencontros, mitos e detalhes se faz a vida destes homens, onde as pedras, o deserto, a fortalez – longamente descrita – soam a coisas vivas tanto ou mais do que as gentes, gentes que funcionam aqui apenas como pequenos insectos parasitas sobre um corpo maior. O isolamento, a missão que nunca chega, as rotinas de um destino infalível criam uma sensação de desprendimento do resto do mundo que insidiosamente se torna definitivo. Este livro é a história de uma vida. Publicado em 1942, em plena WW2, onde a Itália participava como se fosse um sonho, pendurada entre um império desejado e o descalabro ao virar da esquina, é considerado o melhor deste autor. E é um livro por onde já um dia passámos, um dos nossos dias/meses/anos já teve estas mesmas cores, este discurso viciante, a mesma infatigável espera vigilante... Ed. Cavalo de Ferro.