A Cidade de Cobre
O enigma continua: o que faz correr Gil de Carvalho. Publicou em 2001 nas Ed. Cotovia uns textos cuja nota final eu vou começar por citar: "Estas prosas - a que chamei relatos - são uma miscelânea. Parecem-me quase todos eles estranhos, ou alheios, à introspecção. Contam uma história. Dão (ou notam) factos, um acto (ou aconteceres), criam passagens: reais, simbólicas, ou ambas. A língua é por vezes estranha, quando não heterodoxa ou mesmo errada. Não me pareceu curial mudá-la...(...) Diria, restos felizes. (...)". Restos felizes. Oitenta e três restos felizes, textos de duas, três, quatro páginas. Estranheza variável mas que é a regra, não excepção. Na prática como poemas longos, extensão do calmo tremor de terra que é a sua poesia, parece-me. Títulos? "Cedo para as Duas", "O Dito de Valpaços", ou "Uma Fotografia Copta do Museu do Cairo". O melhor? "A Noção de Tempo Segundo Alguma Arquitectura e Certas Figuras Existentes nos Templos Indianos". Deste, por ex. retiro:
"(...)Digo que ensinavam o presente mas talvez fosse outra coisa, mais adiante. Praticamente nunca lhes toquei. É preciso ver que em determinadas partes da Ásia há penetração mal haja um pequeno toque. É o tempo, segundo, já se sabe. Hoje estão casadas - e bem. Percebo quando sou convidado lá para casa (parecem-me felizes: o chão, sagrado, a parentela, excessiva, um garante) que estão completamente preenchidas: sunya, creio ser a designação técnica. (...)"
A ginástica destes textos é às vezes complexa, as posições de difícil aquisição, como se texto sobre texto sub texto. Porque? Gil de Carvalho não corre, acho. Aliás não tem publicado tanto assim. Escreve labirinticamente. Um exercício portanto; um enorme prazer.
"(...)A distribuir, fazer e comer pizzas: Ísis, Osíris, Ptah. Descansem em paz os ladrilhos novos, aos poucos, safados. Elas com as pernas bem rapadas, pintadas como um friso do Egipto.
Dizer que era um dom do rio, ou do Nilo.
- A gaja não'tá boa.
O piloto na ponte levadiça berrou:
- Larga!
E eu larguei."
"(...)Digo que ensinavam o presente mas talvez fosse outra coisa, mais adiante. Praticamente nunca lhes toquei. É preciso ver que em determinadas partes da Ásia há penetração mal haja um pequeno toque. É o tempo, segundo, já se sabe. Hoje estão casadas - e bem. Percebo quando sou convidado lá para casa (parecem-me felizes: o chão, sagrado, a parentela, excessiva, um garante) que estão completamente preenchidas: sunya, creio ser a designação técnica. (...)"
A ginástica destes textos é às vezes complexa, as posições de difícil aquisição, como se texto sobre texto sub texto. Porque? Gil de Carvalho não corre, acho. Aliás não tem publicado tanto assim. Escreve labirinticamente. Um exercício portanto; um enorme prazer.
"(...)A distribuir, fazer e comer pizzas: Ísis, Osíris, Ptah. Descansem em paz os ladrilhos novos, aos poucos, safados. Elas com as pernas bem rapadas, pintadas como um friso do Egipto.
Dizer que era um dom do rio, ou do Nilo.
- A gaja não'tá boa.
O piloto na ponte levadiça berrou:
- Larga!
E eu larguei."
0 Comentário(s):
Enviar um comentário