Perdoar Helena
"A reflexão que proponho nesta peça é sobre a necessidade do perdão e como essa experiência se impõe, a dada altura à Humanidade e à História para ganhar o seu sentido pleno"
Isto afirma o autor José Tolentino Mendonça, ao pretender "explicar" esta sua 1ª peça de teatro, já representada pelos Artistas Unidos. Mais conhecido como poeta, é este texto senão um longo, longo (e belíssimo) poema, e onde se reconhece a nascente mas temos dificuldade em decidir dos vários mares para onde derivam as várias fozes.
Representada que foi por três actores, a mulher não tem aqui fala, lembrará apenas o pretexto "Helena". Esclareço que a peça não vi. Li e para escrever chega-me.
E são um cuidador e um cuidado. Cuidado um encenador, mais velho quero crer, que perante um bloqueio ao encenar Helena de Eurípides, desapareceu - de cena, para só voltar para encantar o cuidador: partigiano. Ter-se-á perdido o homem num mito - a "beleza má" de Helena, ou no todo teatral ("... personagens clandestinos. São uma infiltração. Chegam de todas as partes.") e na imagem de Helena como tecedeira de uma guerra, ou de uma vida - a de todos, gregos e troianos, dez anos de guerra tecidos no engano, ou a imagem em espelho, a de uma Helena tecida por um tear maior, onde os elementos, o tempo, os objectos, o anonimato... "Vejo Helena por toda a parte..." Não seria então culpada Helena mas algo "nuvoloso". Existe Helena?
Começa a peça pelo enunciar da medicação que o cuidador dispensa ao cuidado. Não sei se por desconhecimento os nomes estão alterados, Vastarnel, Flindex... não Lanoxin, o "poderoso veneno do coração". Percebe-se estas drogas, tentativas para resolver este descozimento do coração e dos nervos. Helena e o mundo que nos é destinado, o fado, a beleza - fugidia, a maldade ou as costas de uma mão.
Mas outro lume perpassa por esta peça, um risco a vermelho, a relação de fogo entre cuidado e cuidador, a loucura que fascina e queima brilhante. A descida ao mais profundo de um sonho, ou mito, ou texto. Com uma luz imensa, da qual certamente resultarão não os primeiros mas os últimos "ossos humanos carbonizados". "Há em certas imagens uma dobra. Uma passagem secreta por onde nos esgueiramos."
A sedução através da palavra: partigiano. Partigiano, o herói da resistência italiana, um seguidor, um crente, um cego adquirido.
Eu acho que a explicação acima não tem nada a ver com este texto.
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