quinta-feira, abril 16, 2009

El Lector


El Lector (ed. Anagrama) é um best-seller publicado em 1995 por um escritor alemão, Bernhard Schlink, antes apenas medianamente conhecido como autor de policiais, e que no ano passado foi adaptado por Hollywood – sucursal UK – ao cinema, enchendo Kate Winslet de prémios.
Sintomaticamente, nos 11 anos que se seguiram apareceram dele apenas mais um livro de contos e final e recentemente um novo romance (mixed reviews, etc., etc.).
El Lector é o que antigamente se chamaria uma novela – pouco passa as duzentas páginas. Mas a escrita seca, enxuta, só poética a espaços de Schlink resume uma grande história para estes números, pois que esta consegue disseminar-se por três tempos, separados por anos e décadas, e efectivamente em poucas páginas aqui e ali imensas coisas acontecem. As considerações são concisas, justas, como se decididas há muito, e reduzidas ao osso. Algo de autobiográfico neste livro pode também explicar o seu escrever.
Portanto, é assim: estamos em Heidelberg, no pós-guerra, e um rapaz de 15 anos, Michael, tem uma curiosíssima relação com uma mulher de 36, Hanna, revisora de tranvia. Uma relação que é sobretudo sexual mas que ganha progressivamente uma intensidade e características invulgares, de ambas as partes. Os encontros, com poucas excepções, decorrem assim: ele chega, eles tomam banho, ele lê-lhe um livro, eles fazem amor. Esta sequência é um achado, mas um achado só não faz grande literatura. Há porém detalhes na construção do texto que progressivamente nos levam para o lado de lá. Tudo porém tem um fim e esta história de iniciação sexual redonda em declives e abismos também: sem se perceber bem porquê a revisora um dia desaparece. Para anos depois o agora estudante de direito descobrir que Hanna fora guarda prisional num campo de concentração e participara não só no crime diário do campo em si mas num crime ainda mais hediondo, móbil central do julgamento em que Michael casualmente reencontra Hanna. Esta acaba por ser declarada a culpada principal e condenada à prisão perpétua. O seu comportamento durante o julgamento é também não o mais normal. Hanna tinha um segredo: não sabia ler nem escrever. Michael descobre o segredo por pura dedução durante o julgamento mas nada faz para avisar o juiz da atenuante.
Este livro – como todos os best-sellers e ainda mais quando transformados em filme de sucesso – foi criticado por muitas coisas, e uma delas por situar numa analfabeta o enigma da possibilidade de um ser humano – e Hanna é muito humana, o livro é mais de duzentas páginas a demonstrá-lo – ter cometido diariamente e com paroxismos de agravamento coisas monstruosas. Uma alemã, um povo dito "de letrados". A iliteracia de Hanna é aqui apenas um fait-divers, um achado-debaixo-do-achado: “quero que me leias, rapaz!”. Mas é também um sarcasmo sobre a famosa interrogação de “como o nazismo pode ter acontecido numa nação tão culta como a alemã”. Não existem nações cultas. Nunca existiram, nunca existirão. Os gestos e procedimentos de Hanna e das suas companheiras de homicídio em massa são perfeitamente críveis, e aceita-se que as outras guardas tivessem mais educação, pelo menos alguma mais. Não é pela “improvável” iliteracia que Hanna sai de ser uma mulher alemã vulgar. O algo “a mais” que ela demonstra é fruto de complexo processo de sucessivo enredo de uma vida onde o fio condutor é que nunca ninguém descubra o seu defeito, o seu não saber. Em Alemanha já então uma vergonha, por ex. em Portugal facilmente confessável ainda hoje.
Em cima disto, a qualidade da relação Hanna-Michael, 1ª parte, fica sem definição, nem o autor se dá a esse trabalho. Retiremos a palavra futuro de cima da mesa. Coloquemos a palavra “felicidade”. Hanna foi feliz, num enclave espaço-tempo tão improvável, enquanto Michael crescia. Quem tem filhos pequenos pode acalmar – é apenas um livro.
Ao fim de muitos anos de deriva, Michael reencontra em si a ideia obssessiva de Hanna e, descobrindo a prisão onde se encontra, começa a mandar-lhe cassettes com textos que ele lhe lê, outra vez, em voz alta. E durante anos resume-se a isto o retomar desta relação. Um dia Hanna escreve-lhe um bilhete: sinal de que aprendera a ler. Peço não se ache este momento uma incursão no universo TV Globo. E acrescento que não vou contar mais a partir daqui. Há uma desilusão e há um final lógico.
Pode não ser um grande livro, aceito que uma boa história é sempre por defeito aquela coisa que todos nós “afinal-preferimos”… e que os prémios todos que o livro recebeu na Alemanha natal terão sido uma espécie de exorcismo, de alívio, sei lá. Uma história de amor com uma guarda prisional que manda prisioneiras para Auschwitz, vejam só!
Mas este livro tem que ser lido – aliás é matéria de estudo no secundário da Alemanha, suponho que na Áustria não.
Percebe-se a escola policial do autor - veja-se a evolução da higiene do personagem Hanna com mais um sinal de - e o seu conhecimento dos ambientes judiciais.
Terei que outras coisa deste autor - para sair do da coisa do "one hit wonder...ou nem isso".

"Tuve la impresión de que era la última vez que nos sentábamos todos juntos a la gran mesa redonda, bajo la gran lámpara de latón de cinco brazos y cinco bombillas, que era la última vez que comíamos en los viejos platos decorados con zarcillos verdes en el borde, que era la última vez que hablábamos con tanta familiaridad. Me pareció estar viviendo una despedida. Todavía estaba allí, pero ya me había ido. Añoraba a mi madre, a mi padre y a mis hemanos, y al mismo tiempo anhelaba a una mujer.
Mi padre me miró.
-Dices que quieres volver mañana mismo al instituto, verdad?
-Sí.
Vi que se había dado cuenta de que me había dirigido a él y no a mi madre, y también de que yo no estaba dispuesto a reconsiderar mi decisión.
Asintió con la cabeza.
-Pues si quieres, adelante. Y si ves que no puedes, te quedas en cas otra vez.
Me sntí feliz. Y al mismo tiempo tuve la sensación de que en ese momento la despedida
ya se había producido."

PS.: o título original “Die Vorleser” é alemão para ler alto, em voz alta…

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