D. Filipe I
Escreve o espanhol Fernando Bouza sobre uma das figuras nucleares do século XVI europeu, o rei à volta do qual Braudel escreveu páginas e páginas de História e assim revolucionou a forma de ver todo um tempo: Felipe II de España, Filipe I de Portugal.
Folheei por acaso há dias um livro de edição espanhola numa Bertrand e que se intitulava "Reyes de España". Já saído da leitura da biografia sobre que escrevo, lá me dediquei a espreitar uma alternativa - e dirigi-me logo à data nuclear, 1580. A união peninsular era ali descrita com acontecimeto transcendente e quiçás o de maior importância em toda aquela história, ao realizar um ideal aparentemente de há muito perseguido. Nem Fernando Bouza nem aparentemente o próprio Filipe I vão ou terão ido atrás de ideais. Porque ao falar de Filipe I de 1580 estamos a falar. Tio de D.Sebastião e a quem desaconselhou a(s) ida(s) a Marrocos, foi longamente pensado o seu pleito por Portugal. As vantagens e desvantagens. A sua candidatura acabou por ser inevitável. Rei que cultivou a imagem como ninguém, não podia permitir que se desvalorizasse o facto de realmente ser ele o descendente mais legítimo, para além de ser o mais forte. E que forte ele era. Portugal não adquirido seria sempre uma retaguarda por defender. Pouco influenciou ter mãe portuguesa. Mas nunca Filipe se apresentou como rei espanhol mas sim como alguém acima das nacionalidades sobre quem reinava - e eram umas quantas: castelhanos, aragoneses, andaluzes, lombardos, sicilianos, napolitanos, flamengos, neerlandeses, esquecendo todas as possessões ultramarinas que já então eram muitas.
Fernando Bouza descreve minuciosamente estas e muito mais coisas claramente explicando como, estado a estado - 1º, 2º e 3º - Portugal foi convencido e comprado. Trabalho que pacientemente se começou a desenvolver logo a partir de 1578, aquando da morte do Desejado, que cresceu ancorado no impedimento em Roma (Filipe-sponsored) de que o Cardeal D.Henrique desfizesse os votos e pudesse casar (não sabiam desta pois não?), progrediu após a morte deste em sucessivas missões de "convencimento" misturadas com guarnições fronteiriças reforçadas, e que teve a estocada final na batalha de Alcântara com a meia dúzia de rapazes que defenderam D.António. A cereja no bolo: as cortes de Tomar, 1581, onde quase todas as prerrogativas do reino que foram pedidas concedidas foram. E tivemos rei em Lisboa a viver até 1583. Mais não.
O livro pouco fala dos anos 1583-1598, e compreende-se. Havia pouco reinar. Filipe I estava no Escorial, longe de todos, Portugal incluido.
A parte final do livro demora-se a retratar a enigmática figura. Mecenas de pintores, monarca recluído, frio e insensível? Algum anedotário tenta desfazer esta imagem. É curioso o seu relacionamento estreito com figuras que se poderiam chamar "bobos da corte". É espantoso o cuidado de Filipe I em modelar a sua imagem perante o mundo. Espanha no entanto não o deve ter entendido e terá suspirado de alívio quando da sua morte. Há quem diga porém que foi seu um século.
Nota: Fernando Bouza é realmente Fernando Bouza Álvarez, assim citado vastamente através da Internet.
0 Comentário(s):
Enviar um comentário